África Austral: medição é fundamental para enfrentar GBV


Date: November 27, 2014
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Joanesburgo, 25 de novembro: Nesta terça, o mundo assinala o inÁ­cio dos Dezasseis Dias da Campanha de Não-Violência Contra a Mulher. Com efeito, desde 1991, que este marco no activismo em prol da igualdade de género é o padrão da estratégia global da sociedade civil e dos governos para apelarem pela eliminação de todas as formas de violência contra as mulheres. Vinte e três anos depois, estamos condenados ao desespero e com a quase certeza de uma batalha perdida. As estatÁ­sticas são assustadoras e qualificam a Violência Baseada no Género (VBG) como uma pandemia que necessita de atenção urgente.

Na África Austral, seis paÁ­ses realizaram o estudo de base sobre a violência contra as mulheres (VCM) em quase todos eles, o estudo revela que a Violência Baseada no Género (VBG) é generalizada em toda a região. A maior prevalência é relatada na Zâmbia, onde 89% das mulheres do Kasama, Kitwe, Mansa e Mazubuka foram vÁ­timas de violência. Enquanto isso, 86% das mulheres no Lesoto, 68% no Zimbabwe, 67% no Botswana, 50% na África do Sul (Gauteng, Limpopo, Western Cape e KwaZulu Natal) e 24% das mulheres nas MaurÁ­cias afirmaram terem sofrido da VBG.

Os resultados revelam algo ainda mais perturbador À“ que os homens entrevistados não estão apenas a validar estes números, mas em alguns casos hÁ¡ alguma tendência para superar os números reportados. Setenta e três por cento dos homens na Zâmbia e 22% nas MaurÁ­cias disseram ter perpetrado violência de género, pelo menos uma vez. A proporção de homens que confessaram terem praticado o estupro nos seis paÁ­ses em anÁ¡lise é significativamente maior do que a proporção de mulheres que relatam terem passado por uma experiência do género.

Desmontar o tecido social patriarcal conservador e condescendente aos agressores e a re-vitimização de mulheres são apenas os dois lados da mesma moeda, mas, mais do que descobrir isso, urge compreender a complexidade da incidência da VBG. Pelo que é importante desenhar os mecanismos de coleta de informaçÁµes sobre VBG em todos os paÁ­ses onde os dados não são sistematizados, assim como aprimorar a implementação das estratégias de luta, para tornar acutilante a investigação a monitoria e a avaliação sistemÁ¡tica, orientada para resultados. Ademais, sem esta informação os cidadãos, em particular e a sociedade civil, em geral, tornam-se impotentes e incapazes de responsabilizar os governos.

E isto explica-se com atitudes tais como a falta de liderança e vontade polÁ­tica dos governos africanos na retórica patriarcal generalizada, na quase ausência da prevenção da VBG e do entusiasmo na abordagem pública da temÁ¡tica sobre género, falta dos planos nacionais de acção e de comprometimento na implementação da agenda 50/50, no processo de tomada de decisão polÁ­tica.

A tÁ­tulo de exemplos, após as eleiçÁµes no Malawi e na África do Sul, vimos recuos na representação das mulheres no governo. Todavia, aguardamos melhores resultados na participação da mulher nos fóruns decisórios em Moçambique e Botswana, na sequência das recentes eleiçÁµes. Não obstante a nossa expectativa, jÁ¡ podemos antecipar um declÁ­nio da participação da mulher no governo nas próximas eleiçÁµes nas MaurÁ­cias a avaliar pela fraca participação da mulher na vida polÁ­tica naquele paÁ­s da sub-região.

Após as eleiçÁµes legislativas na África do Sul, em Maio passado, o governo sul-africano extinguiu o Ministério das Mulheres, Crianças e Pessoas com Deficiência e criou no seu lugar um novo Ministério da Mulher na Presidência, o que representa um grande revés.

Ainda nesse perÁ­odo, na África do Sul foi suspenso o Conselho Nacional contra a VBG, o que significa que o seu trabalho crucial e urgente estÁ¡ sendo adiado até que o Governo decida qual o departamento que novamente irÁ¡ abrigÁ¡-lo.

Durante uma reunião pública sobre os Dezasseis Dias de Activismo organizada pelo Ministério Sul-africano da Mulher, o ministro Susan Shabangu abriu a sessão exprimindo o seu desejo de, durante a campanha, concentrar-se na mobilização de homens para serem os protectores das famÁ­lias, negando que as mulheres continuem vÁ­timas da VBG.

Além da falta de consideração para com as questÁµes do género, insultos e injúrias contra a mulher, outros lÁ­deres presentes no evento, sugeriram cortes de financiamento aos centros de apoio a VCM, ao mesmo tempo que pediam para a que a VBG fossem estritamente reservada para o fórum caseiro. Esta uma situação que choca contra os valores da humanidade, não só pelo facto de elas saÁ­rem da boca dos lÁ­deres, mas porque elas perpetuam a cultura do silêncio contra a Violência Baseada no Género, geralmente perpetrada por um parceiro Á­ntimo, entre quatro paredes.

Estas atitudes persistem apesar dos compromissos assumidos pelos governos regionais e internacionais sobre equidade de género. Com efeito, em Agosto de 2008, os Chefes de Estado da SADC adoptaram o Protocolo sobre o Género e Desenvolvimento, protocolo que, entre outros objectivos, visa reduzir para metade a VBG até 2015. O protocolo exige igualmente que todos os Estados membros ajam com a devida diligência para prevenir, investigar e punir todas as formas de violência de género e fornecer um recurso efectivo para os sobreviventes. Alguns paÁ­ses avançaram mais um passo para adoptar os planos de acção nacionais de 365 dias para acabar com a VBG.

Daqui ressalta a necessidade de dados precisos e abrangentes para garantir a responsabilização dos governos para prevenir, tratar e responder a VBG. HÁ¡ uma necessidade urgente de se estabelecer linhas de base da VBG em todos os paÁ­ses da SADC e fortalecer quadros integrados de planos orçamentados para acabar com a VBG. HÁ¡ também uma necessidade de indicadores padronizados acordados em todos os paÁ­ses da SADC.

Se não estamos munidos deste conhecimento, não podemos responsabilizar os nossos lÁ­deres, não podemos exigir nossos direitos e continuarmos reféns dos caprichos e das fracas soluçÁµes dos polÁ­ticos e das polÁ­ticas não confiÁ¡veis que fazem pouco para avançar a luta permanente rumo Á  igualdade, justiça e paz.

Medir e responder Á  VBG é parte dos deveres e obrigaçÁµes de cada estado, para que não mais se repitam as guerras contra o corpo das mulheres.

Linda Musariri é Oficial de Justiça na sede da Gender Links. Este artigo faz parte da série especial dos 16 dias de Activismo do Serviço de Noticias da Gender Links, oferecendo novas ideias sobre notÁ­cias diÁ¡rias.


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