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Joannesburg, 9 de Agosto: Ainda no limiar da estação fria e no mês da mulher sul-africana, pouco tenho para comemorar.
Por essas alturas, em vez de nos debruçarmos sobre o quão distante caminhamos rumo Á emancipação da mulher, em vinte anos da nossa jovem democracia, metade dos sul-africanos são monopolizados pela notÁcia mediÁ¡tica do então herói nacional do desporto, o atleta paraolÁmpico, Oscar Pistorius, que fulminou com tiros de pistola, nome de objecto letal que rima com o seu sobrenome, a sua namorada Reeva Steenkamp, precisamente, no dia de São Valentim, cÁ¡ entre nós, conhecido também, por Dia dos Namorados, passam 18 meses.
A acusação, liderada por Gerrie Nell, qualificou de feminicÁdio – assassinato de uma mulher por um parceiro Ántimo – o acto praticado por Pistorius.
Este tipo de crimes, de acordo com as estatÁsticas mais recentes, acontece a cada oito horas na África do Sul, sendo as principais vÁtimas, as mulheres.
Enter Barry Roux, advogado-chefe de defesa de Pistorius, no fecho dos argumentos de defesa comparou o seu cliente com uma mulher abusada que brutalizada vÁ¡rias vezes, chega a ponto de se rebelar e praticar o assassinato de seu parceiro, num acto de desespero e de auto-defesa.
A juÁza Thokozile Masipa disse que entendia como isso pode se aplicar a uma mulher abusada, mas perguntou ao Roux como isso poderia se aplicar ao Pistorius?
Roux respondeu: “Tu és um rapazinho sem pernas, vives diariamente essa deficiência, sabendo que não tens como disso fugir.
Sabes que: “eu não posso fugir, que eu não tenho uma resposta de fuga”.
Isso, ajuntou Roux, de alguma forma, explica porquê Pistorius, que afirma ter ouvido um intruso na casa, disparou contra a Steenkamp!
Tentei manter a calma e ficar assistindo, na minha televisão, todas as noites, essa dura e dramÁ¡tica realidade cujo cenÁ¡rio era aquela sala de audiências do tribunal.
O facto de que Pistorius matou a sua parceira Ántima, não estÁ¡ em dúvida. Todavia a intenção subjacente ao feminicÁdio é que constitui o único ponto de discórdia. Quando isto é comparado com uma mulher abusada que assassina o seu parceiro depois de anos de abuso verbal e psicológico, eu perco-me!
A pesquisa feita pela GenderLinks sobre a Violência Contra as Mulheres e Raparigas (VAWG) em cinco paÁses da África Austral e em quatro provÁncias da África do Sul mostra que, de todas as formas condenÁ¡veis da violência, desde a emocional, verbal, fÁsica e sexual – as duas primeiras sãos tidas como as de maior frequência entre os casais.
Também existem outras formas de violência baseada no género, mais subtis, tal é o caso da violência psicológica que é uma espécie de morte lenta que muitas mulheres experimentam no seu dia-a-dia.
Roux observou que poderia perceber no caso de uma mulher que nestas circunstâncias, se levanta e atira contra o seu parceiro. Mas, infelizmente, esse não é o caso que estÁ¡ a ser julgado em tribunal.
Pesquisas hÁ¡ que nos mostram que as mulheres que matam seus parceiros, em resposta a anos de abusos recebem sentenças muito mais duras do que os homens que matam as suas mulheres, como resultado do seu ego machista por orgulho ferido.
Imagino se a modelo Stennkamp tivesse matado Pistorius o que diriam as manchetes na mÁdia; mulher assassina, louca, bruxa diabólica e muito mais conotaçÁµes pejorativas. Mas na verdade, trata-se de um homem que matou uma mulher. Independentemente das razÁµes que poderão estar por detrÁ¡s desse acto a todos os tÁtulos condenÁ¡vel.
Roux, encarregado pela defesa do arguido, pretende nos fazer crer que Pistorius agiu em legÁtima defesa, contra uma suposta intrusa que invadira o seu banheiro. Então, Pistorius, valeu-se da sua deficiência, comparada a uma mulher abusada – argumenta o advogado de defesa do atleta paraolÁmpico.
Além da minha própria repulsa a este assassinato gostaria de saber o quê diriam aqueles que defendem cegamente, os direitos das pessoas com deficiência.
Para Pistorius, a vida inteira de deficiência leva Á paranoia, perda de controlo e dos sentidos.
Quatro testemunhas independentes declararam, em tribunal terem ouvido uma mulher a gritar antes e depois os tiros.
O advogado de OJ Simpson, Johnnie Cochran, quando a partir de Londres foi solicitado a comentar o caso Pistorius disse publicamente que ele nunca teria desafiado o caso Pistorius.
Todavia, a defesa argumenta que Pistorius deve ser absolvido porque foi tudo um grande equÁvoco.
E eu estou ouvindo Nell, em tribunal, a contrariar a defesa, enquanto apela a Pistorius: “diga que a mataste, assuma a responsabilidade”, e ele a recusar fazer isso.
Lembro-me que as suas lÁ¡grimas e pedido de desculpas aos pais de Reeva não me fizeram mudar de opinião, sobretudo quando constato que todos concordarmos que Pistorius fez um fraco testemunho e o seu caso fez mais maldade do que o bem.
E, de acordo com Nell, Pistorius deixou cair o bastão da verdade para evitar terminar a corrida.
Entretanto Roux contra-ataca argumentando que o Ministério Público, ou seja, a acusação não conseguiu provar “além de qualquer dúvida razoÁ¡vel” que Oscar e Reeva tiveram uma discussão que levou Pistorius a atirar para matar.
Se não hÁ¡ assassinato, diz a acusação que, Pistorius deve, no mÁnimo, ser culpado de homicÁdio culposo, portanto, por negligência.
Caso para repetir “passados 20 anos da nossa jovem democracia, a vida de uma mulher ainda significa muito pouco, se comparada com a vida de um homem, na África do Sul multi-racial de Madiba “.
Pelo que, tanto como Pistorius a África do Sul estÁ¡ também em julgamento no presente caso.
Colleen Lowe Morna é a Presidente do Conselho de Administração da Gender Links. Ela escreve este artigo na sua capacidade pessoal. Este artigo é parte do Gender Links News Service, oferecendo novas ideias sobre a actualidade informativa diÁ¡ria.
📝Read the emotional article by @nokwe_mnomiya, with a personal plea: 🇿🇦Breaking the cycle of violence!https://t.co/6kPcu2Whwm pic.twitter.com/d60tsBqJwx
— Gender Links (@GenderLinks) December 17, 2024
Comment on África do Sul: Oscar Pistorius! Longe da mulher abusada