Moçambique: “Gosto de fazer trabalhos dos homens”- sentencia Maria Nhapule, mulher de fibra

Moçambique: “Gosto de fazer trabalhos dos homens”- sentencia Maria Nhapule, mulher de fibra


Date: December 8, 2014
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Maputo, 7 de Dezembro: Não se surpreenda quando no posto de vendas de pneus, na Avenida Acordos de Lusaka, em Maputo, dares de caras com uma mulher forte e simpÁ¡tica vestida de macacão de mecânico À“ pois, saiba caro leitor que se trata de Maria Nhapule, a mulher que monta e desmonta pneus de camiÁµes como se de um homem se trata-se.

Maria Nhapule (MN), não tem medo de enfrentar a dura realidade do trabalho braçal no dia-a-dia num estaleiro.

Para ela, “o ambiente de trabalho de um estaleiro é o melhor que existeÀ.

No âmbito do empoderamento da mulher, no quadro da emancipação da mulher moçambicana, num processo emancipatório que remonta dos tempos da luta de libertação nacional a mulher estÁ¡ hoje em todos os domÁ­nios do mercado de trabalho e não só.

O sector automóvel, tradicionalmente dominado por homens estÁ¡ a ganhar nos tempos que correm, cada vez mais o toque feminino, através de mulheres que não têm medo de enfrentar as dificuldades de adaptação neste ramo de actividade.

Numa conversa animada com a Gender Links (GL), Maria nos contou a sua história, sua paixão pela Á¡rea de reparação e venda de pneus, suas expectativas e falou-nos sobre a sua batalha diÁ¡ria no chão do estaleiro.

Confira partes mais significativas da entrevista com a nossa “Dama de FerroÀ:

GL: Quando e como entra neste negócio?

MN: “… Comecei a desenvolver este negócio na década 80, com apenas 2 pneus de camião e fui crescendo. Na altura não tinha estaleiro, fazia entregas ao domicÁ­lio, o meu grande cliente era a empresa transportadora interprovincial Oliveiras Lda, que jÁ¡ faliu. Mais tarde, passei a vender pneus pequenos e abri o estaleiro…À.

GL: O que faz com que a senhora Maria se engaje neste negócio?

MN: “… Sempre gostei de fazer trabalhos tidos como masculinos. Basta dizer que antes de vender pneus trabalhava numa barbearia, onde cortava barba e cabelos aos homens.

Ä– importante referir que abracei o negócio de venda de pneus com o apoio do meu marido que trabalha comigo.À.

GL: De onde trazem os pneus?

MN: Da vizinha África do Sul, as vezes vou pessoalmente ou me trazem. Pelo menos, duas vezes por mês recebo 200 pneus.

GL: EstÁ¡ satisfeita com o nÁ­vel de vendas?

MN: Estou satisfeita porque consigo comprar alguma coisa para os meus filhos.

GL: Tem quantos filhos?

MN: Três. Os dois mais novos estão a estudar e o mais velho estÁ¡ em casa. Tenho também três netos…À.

GL: Antes de entrar no mundo dos negócios como era a sua vida?

MN: “… Mudou muita coisa na minha vida porque consigo sustentar os meus filhos e netos. Também consegui construir duas casas, uma na cidade de Maputo e a outra no distrito de Boane, hÁ¡ 30 quilómetros de Maputo. Também tenho três carros…À.

GL: Que tipo de dificuldades a Senhora Maria jÁ¡ passou na vida e que mensagem deixa para aquelas mulheres que têm medo de enfrentar a vida, limitando-se a ficar em casa Á  espera dos maridos?

MN: “… O meu desejo é que as outras mulheres não cruzem os braços a espera dos maridos. A mulher tem que levantar e fazer qualquer coisa para ajudar o marido a sustentar a famÁ­lia…À.

GL: Disse que passou por muitas dificuldades na vida, pode partilhar connosco esses momentos difÁ­ceis?

MN: “… JÁ¡ passei fome, jÁ¡ dormi sem jantar e sem cobertor. Portanto, jÁ¡ tive falta de tudo até de chinelos para me pôr na rua. Nem capulana tinha. Hoje tudo isso jÁ¡ mudou, tenho um pouco de tudo graças ao meu próprio esforço…À.

GL: É necessÁ¡rio algum conhecimento para vender pneus?

MN: “… Vendo pneus de segunda mão. Pelo que é preciso conhecer bem o pneu para comprar gato por lebre, no momento de selecção na África do Sul. É preciso saber identificar os pneus de boa e de mÁ¡ qualidade, os pneus com furos ou rasgados e jÁ¡ gastos. Também sei montar o pneu no carro…À.

GL: Com esse conhecimento consegue evitar muitas quebras?

MN: “… Como faço a montagem cÁ¡ em Moçambique, as vezes descubro quebras e defeito fora. Por exemplo, em cada 100 pneus 10 são quebras…À.

GL: Tem quantos trabalhadores?

MN: “… Tenho três rapazes…À.

GL: Hoje muitas esquinas estão repletas de estaleiros de venda de pneus, até que ponto isso complica o seu negócio?

MN: “… Acredito que eu e o meu marido fomos os primeiros a vendar pneus aqui na avenida Acordos de Lusaka. Os outros estavam no Xiquelene, só que quando viram o nosso sucesso se aproximaram…À.

GL: Como se sente por estar a exercer uma actividade tida como masculina? Portanto, para homens.

MN: “Sinto-me bem. Para mim não existe trabalho para homens nem para mulheres. Fui a escola só para conseguir fazer as contas”

GL: Qual é a reacção das pessoas, principalmente dos homens quando vê a senhora a colocar pneus?

MN: “… Assustam-se. As vezes me perguntam se sou eu mesma que vendo e monto os pneus e eu respondo que sim. Sou eu mesma que faço tudo aqui no estaleiro.

Alguns homens mandam-me afastar e eu digo que não, deixem-se fazer o meu trabalho…À.

GL: Onde é que a senhora aprendeu a mexer com pneus?

MN: “… Aprendi com a vida…À.

GL: O que mais falta para saber nesta Á¡rea de pneus?

MN: “… Como mulher hÁ¡ muita coisa que podia aprender, mas eu não chego lÁ¡ por causa do corpo, sou forte, não consigo por exemplo inclinar…À.

GL: Antes de estar muito forte baixava?

“… Baixava sim, levantava o carro, punha o macaco, tirava e montava o pneu mas agora não. Também jÁ¡ estou mais velha…À.

GL: Os seus filhos conhecem este trabalho?

MN: “… Não. Mas agora estou a ensinar o meu neto que tem 17 anos. De manhã vai a escola e a tarde estÁ¡ aqui no estaleiro…À.

GL: Esta veia de empreendedora puxou de alguém da sua famÁ­lia?

MN: “… Puxei da minha mãe que era uma grande batalhadora…À.

GL: Estudou até que classe?

MN: “… Os meus pais eram pobres por isso não me mandaram Á  escola. Eu comecei a estudar agora aqui no estaleiro, só para conseguir-me comunicar com os clientes e fazer algumas contas…À.

GL: Para conseguir fazer as contas?

MN: “… Sim, porque não sabia nada…À.

GL: Então fez alfabetização agora jÁ¡ crescida?

MN: “… Sim, numa escola aqui atrÁ¡s do estaleiro. SaÁ­a daqui do estaleiro para escola e vinha continuar com o trabalho. Quando me apercebi que jÁ¡ sabia ler e escrever parei e me matriculei na escola de condução para tirar a minha carta…À.

GL: E conseguiu concluir que nÁ­vel?

MN: “… Fiz 4 ª Classe porque não tinha tempo para continuar, estava na escola mas a pensar no negócio…À.

GL: Alguma mensagem para o seu marido?

MN: “… Gosto muito do meu marido foi ele que me ensinou este negócio. Estamos felizes. DaÁ­ que temos muita força para desenvolver este negócio…À.

GL: Como se chama o seu esposo?

MN: “… Américo Matos Nhapule, esse é que é meu grande amor, o meu gato…À. (Risos)

GL: Estão casados hÁ¡ quanto tempo?

MN: “… Estamos juntos desde 1980 e casamo-nos oficialmente em 2009…À.

 


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