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Maputo, 11 September: A Associação dos Deficientes FÁsicos (ARDIF), em Maputo, aposta no empreendedorismo, na promoção da igualdade do género e no auto-sustento – mas pede dignidade aos portadores da deficiência – pois, acredita que a deficiência é apenas um destino e não uma fatalidade ou maldição.
Habitualmente, toda a pessoa portadora da deficiência se queixa das mesmas coisas, no seu dia-a-dia; falta de dinheiro para o seu sustento e dos seus filhos/netos – quando os hÁ¡, dÁ¡ falta de abrigo – para não dizer casa própria que isso é pedir demais, da descriminação da famÁlia, do vizinho, nas ruas, no emprego, na escola e até nas instituiçÁµes públicas afins.
Reclamam a falta de oportunidades para concorrerem a uma vaga de emprego, das dificuldades no acesso ao transporte público, ao ensino, Á s casas de banho públicas, enfim, queixam-se da sua própria ausência na sociedade, inotÁ¡veis que são.
Porque por muito insignificante que é a formiga não reclama nunca da sua franqueza nem desiste de carregar o grau de milho ou de açúcar, caÁdo na cozinha. Cedo aprendeu que a união faz a força.
Inspirando-se no exemplo da formiga, os portadores da deficiência fÁsica decidiram unir-se e constituir uma associação de artesãos, para abraçarem o empreendedorismo e por essa via vencerem as dificuldades do dia-a-dia.
Os associados do ARDIF afiançaram Á Gender Links que não querem mais passar por situaçÁµes de humilhação e descriminação, tal como acontecia quando deambulavam pelas ruas da cidade de Maputo a pedir esmola, pois aperceberam-se que a deficiência fÁsica não é sinónimo de inaptidão total.
“HÁ¡ muitos portadores de deficiência, de ambos os sexos, a palmilhar as ruas da nossa cidade, que são humilhados por falta de auto-estima. Estes pensam que pelo simples facto de terem contraÁdo a deficiência, isso é, por si, um atestado de total inaptidão que é o fim das suas vidas. Mas aqui no ARDIF, nós não pensamos mais assim. Aqui, vai-se Á¡ luta pela vida e com muita dignidade…” – Rematou Aida Maculuve, 39 anos, membro da associação.
Maculuve, é mãe de cinco filhos e avó de três netos e, o seu rendimento mensal varia entre os dois a três mil meticais dependendo das vendas, na loja da associação.
“Enquanto famÁlias hÁ¡ que passam três a quatro refeiçÁµes diariamente, na minha casa só temos uma única refeição por dia – precisou Aida Maculuve, ainda com a cara cheia de lÁ¡grimas.
A ARDIF estÁ¡ localizada ao longo da Avenida da Marginal. O espaço foi cedido pelas autoridades municipais em 1971, quatro anos antes da Independência Nacional pelo punho do Eng º. Omero Ferinho, de origem portuguesa, que tinha o sonho de formar e treinar deficientes.
Os filiados na ARDIF usam todo o seu talento para produzir tudo que é possÁvel em especial através do cabedal. Dessas habilidades nascem diversos estilos de calçado, carteiras, pastas e outros acessórios manufaturÁ¡veis a partir da pele dos animais de grande porte. Todos aprenderam o artesenato, na associação, pelas mãos de um cidadão de origem inglesa, Lane Thood, que viveu em Moçambique na década de 90 tendo depois se transferido para a vizinha Tanzânia.
Os turistas e nacionais afeiçoados pelo artesenato em cabedal alÁ na Marginal compram os produtos de cabedal.
O batique e as estÁ¡tuas são compradas na FEIMA (Feira de Artesanato, Flores e Gastronomia), em Maputo, embora alÁ também sejam vendidos.
A peça de cabedal mais barata é uma pulseira que custa 30 meticais, o equivalente a 1 dólar norte-americano e demora cerca de 30 minutos a ser feita.
A pasta de cabedal é o produto mais caro, chegando a custar 6 mil meticais, cerca de 200 dólares norte-americanos, mas a sua produção, por encomenda demora uma semana.
Dos catorze membros da Associação dos Deficientes FÁsicos, sete são Mulheres e igual número, Homens, respeito escrupuloso da equidade do género, em cumprimento de uma das metas do desenvolvimento do milénio e do Protocolo da SADC sobre Género e Desenvolvimento.
Além deste detalhe, a direção do ARDIF é comandada por uma mulher, o que orgulha os membros da associação, em matéria da promoção das oportunidades de liderança na mulher, da tolerância zero, contra os estereótipos.
Armando Muianga, chefe da produção da associação, condena o machismo que ainda se faz sentir no seio da sociedade moçambicana, bem assim como as desigualdades de género nas instituiçÁµes, sobre tudo, a segregação e exclusão da comparticipação da mulher, na esfera de desenvolvimento:
“Acho que o tempo da descriminação, jÁ¡ passou. As pessoas devem serem tratadas de igual modo”. Resumiu a fonte.
Beatriz Seraz, presidente da associação, afirma que é importante que haja uma mudança de pensamento e atitudes nas pessoas, especialmente em relação ao angulo em que é vista a mulher pela sociedade moçambicana:
“Tendo em conta que em diversos sectores de trabalho ainda predominam estereótipos contra a mulher – quanto Á sua participação na vida laboral e na tomada de decisão, na ARDIF esses estereótipos fazem parte do passado – disse Beatriz Seraz.
No ano da sua fundação, a associação tinha 21 membros, sendo 12 mulheres e 9 homens, mas a falta de convicção fez com que alguns membros ficassem pelo caminho.
De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde, mais de um bilião de pessoas são portadoras de deficiência no mundo. Mais de 80 milhÁµes destas pessoas vivem no continente Africano.
Moçambique é um dos paÁses da África Austral com um número maior de pessoas vivendo com diferentes formas de deficiência. Estima-se que o número de pessoas portadoras de deficiência neste paÁs do oceano Ándico ultrapasse um milhão e meio. A situação é agravada pelo Ándice elevado de pobreza e a existência de minas antipessoais espalhadas durante a luta de libertação nacional e no conflicto armado de 16 anos entre o governo e a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) que terminou em 1992 com o Acordo de Paz assinado em Roma.
Albano Fumo é um jornalista freelance em Maputo. Esta história faz parte do Serviço de NotÁcias da Gender Links, oferecendo novos pontos de vista sobre o dia-a-dia da actualidade informativa.
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Comment on Moçambique: Promover a igualdade de género, aceitando a deficiência como um desafio