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Beira (Moçambique), 18 de Agosto de 2012 À“ Não obstante as declaraçÁµes e cometimentos sobre a promoção da equidade e igualdade do género, a mulher continua a comer o pão que o diabo amassou, principalmente no mercado laboral e não só.
Em Moçambique, os desafios e perspectivas da igualdade e empoderamento variam grandemente, desde as mais de 30% de todas as mulheres que vivem em agregados familiares polÁgamos ao número “crescenteÀ de agregados familiares em “melhor situaçãoÀ chefiados por mulheres; desde as mulheres com um salÁ¡rio alto, gordo e com acesso ao crédito bancÁ¡rio Á s mulheres que vem os seus projectos chumbados e sem acesso aos sete milhÁµes.
Desde as camponesas pobres no norte grandemente rural e matrilinear Á s mulheres comerciantes no sul urbano e patrilinear; desde as jovens raparigas crescendo num ambiente seguro com acesso Á educação e perspectivas de emprego Á s mães jovens sem acesso Á educação e a relaçÁµes sociais chave, cujas perspectivas estão limitadas mesmo antes de a vida adulta ter começado.
Embora tais diferenças estejam frequentemente escondidas em declaraçÁµes gerais de polÁtica e estatÁsticas nacionais, é absolutamente essencial a compreensão destas complexidades para o desenho de polÁticas e intervençÁµes relevantes para a melhoria da condição da mulher em Moçambique.
Camilla Oliveira do Valle, num trabalho sobre Democracia, Economia e Género: pensando a emancipação escreveu: “O capitalismo é incomparavelmente indiferente Á s identidades sociais das pessoas que explora; logo, a exploração capitalista não se liga a identidades, desigualdades ou diferenças extraeconômicas polÁticas ou jurÁdicas, uma vez que a extracção de mais-valia dos trabalhadores assalariados acontece numa relação entre indivÁduos formalmente iguais e livres e não pressupÁµe diferença na condição polÁtica ou jurÁdica. Ele poderia sobreviver Á erradicação de todas as opressÁµes especÁficas das mulheres, na condição de mulheres À“ embora não pudesse sobreviver Á erradicação da exploração de classeÀ.
Olhando para estas palavras da Camilla do Valle, surge-me uma curiosa incongruência entre, por um lado, as frequentemente amplas e extensas declaraçÁµes sobre a desigualdade de género que são reais e, por outro lado, a grande variação e complexidade na vida dos homens e mulheres reais.
Quantas mulheres em Moçambique, hoje estão felizes com os seus rendimentos? Quantas destas, sobretudo no meio rural, têm acesso aos créditos (7 milhÁµes, Xitiquis, e outras formas de poupança e renda)? Quantas mulheres estão realmente emancipadas do ponto de vista económico; isso tendo em conta o conceito de Marx que diz que a emancipação é um processo social, que estÁ¡ estreitamente ligado Á liberdade, Á luta de classes, e Á instauração de um novo modelo social que supere aspectos do modelo vigente.
É preciso o cuidado para que não haja confusão teórica com outros processos individuais que visam a autodeterminação, e desenvolvimento pessoal e intelectual do ser humano.
1. Quantas destas mulheres aparentemente satisfeitas com os seus rendimentos administram directamente as suas rendas?
2. SerÁ¡ que como pais e com os 37 anos de Independência, podemos considerar as mulheres moçambicanas economicamente “resolvidasÀ se olharmos para a situação Politica (tomada de decisÁµes, paridade) e económica (acesso a créditos, seja ele de que forma)?
Camilla do Valle conclui o seu trabalho afirmando que “Sob o capitalismo, as mulheres conquistaram direitos polÁticos que não possuÁam; podendo-se afirmar que a tendência Á igualdade formal criou pressÁµes favorÁ¡veis Á sua emancipação. A indiferença estrutural do capitalismo pelas identidades sociais das pessoas que explora torna-o capaz de prescindir das desigualdades e opressÁµes extra-económica; esta tendência implica que as lutas concebidas em termos exclusivamente extra-económicos, como a puramente contra a opressão de género, não represente um perigo fatal a ele.
Todavia, por maior que seja a tendência a diluir as desigualdades de identidade, o aproveitamento que o capitalismo tem da opressão de género, no sentido de se beneficiar destas subclasses, faz com que ele a mantenha. O capitalismo faz uso ideológico e económico da opressão de género, daÁ a pouca probabilidade da luta contra a opressão de género sair vitoriosa caso permaneça isolada da luta anti-capitalista.
Face Á isso, podemos nós concluir que por mais que sejamos ricos como paÁs e que nas famÁlias a mulher seja a que mais rendimentos financeiros possui, ela serÁ¡ sempre mulher olhando para aquilo que são os nossos modelos de educação a partir da famÁlia e até aos nossos locais de trabalho?
Por mais que seja ela a trabalhar e a trazer rendimentos para a famÁlia e incluindo para a economia nacional, sempre estarÁ¡ em segundo plano, sendo considerada como aquela que só gasta e pouco contribui para a familia?
Celina Henriques é uma jornalista residente na Beira. Este artigo faz parte do Serviço Lusófono de Opinião e ComentÁ¡rio da Gender Links
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