Moçambique: Usar as cheias como plataforma para mudanças sociais


Date: January 31, 2013
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Maputo, 31 de Janeiro de 2013 À“ Existem momentos que apesar da profunda tristeza que mergulham uma sociedade, podem e devem ser usados para se efectuar mudanças sociais – as cheias que se registam em Moçambique e parte da África Austral podem ser um ponto de partida para mudanças sociais.

Diversos estudos mostram que calamidades naturais têm um maior impacto sobre mulheres e crianças do que sobre os homens devido Á  sua situação de vulnerabilidade. Só em Moçambique morreram mais de 40 pessoas, mas apesar de nem as autoridades nem a comunicação social terem-nos dado uma desagregação dos mortos por sexo e idade, pode se arriscar que a maioria deve fazer parte do grupo mulheres e crianças.

Mas o que a tragédia tem a ver com mudanças sociais? Bem, talvez a melhor pergunta seja se as calamidades naturais podem ser usadas como plataformas para mudanças sociais. Invariavelmente, em sociedades tradicionais as mulheres recebem papéis de cuidadoras de famÁ­lia, o que é naturalmente transferido para situaçÁµes de risco e emergência.

E da mesma forma que as mulheres são mais vulnerÁ¡veis Á s consequências de calamidades naturais, elas tornam-se actoras inovadoras na busca de soluçÁµes para continuarem a desempenhar o seu papel de cuidadoras de famÁ­lia.

Mas geralmente em tempos de emergência elas raramente conseguem estar ou fazer parte do grupo de pessoas da comunidade que ajudam na distribuição de vÁ­veres. Ademais, as sobreviventes não conseguem discutir ou falar das suas necessidades especÁ­ficas. A comunicação social raramente fala das suas experiências fora o caso de acontecer um caso considerado insólito como o nascimento de uma criança sobre uma Á¡rvore.

A meu ver, talvez as calamidades naturais sejam um ponto de partida para se documentar a experiência das mulheres, dando-as mais voz para comunicar e partilhar as suas experiências. Mas para tal é necessÁ¡rio que as organizaçÁµes de sociedade civil que trabalham na Á¡rea do género façam um trabalho especÁ­fico de empoderÁ¡-las no sentido de elas olharem para as cheias como uma oportunidade para mudar as percepçÁµes da sociedade sobre as suas capacidades e desafiarem os papéis de género na sociedade.

Um estudo da Organização Internacional do Trabalho indica que mulheres em Nicaragua organizaram uma campanha bem-sucedida contra a violência baseada no género em resposta ao aumento dos nÁ­veis de violência após um furacão ter devastado a região. A mensagem transmitida através da comunicação social foi de que a “violência contra a mulher é uma calamidade que os homens podem prevenir.À

Portanto, as mulheres devem exigir que sejam incluÁ­das no processo de planeamento e distribuição de vÁ­veres, mesmo em trabalhos não-tradicionais tais como a construção de casas e abrir poços. É que se ficarem na retina colectiva podem se transformar em modelos nas suas comunidades e assim reduzirem as barreiras que são colocadas para a inserção da mulher na esfera pública.

Elas podem também formar grupos e mobilizarem-se no sentido de satisfazer as necessidades mais pontuais das suas comunidades.

E as mulheres devem lembrar aos demais de que a sua vulnerabilidade precede as calamidades de modo a que a actuação dos agentes do Estado não fiquem apenas na satisfação imediata das necessidades resultantes das cheias.

As mudanças sociais são uma realidade social no sentido de que ocorrem como produto de tensÁµes sociais. Sendo que, haverÁ¡ grande oposição Á s suas tentativas de maior integração nos trabalhos tradicionalmente alocados aos homens, mas se querem introduzir mudanças nas suas sociedades e comunidades, não têm outra alternativa senão confrontar as estruturas patriarcais.

As cheias certamente puseram Á  nu as vulnerabilidades das mulheres e crianças, mas se bem exploradas podem ter um efeito tremendo na transformação social e sobre a mulher e seu papel na sociedade.

Portanto, esta é uma oportunidade quase que soberana para as organizaçÁµes de sociedade civil estabelecerem a ligação dos planos de gestão das calamidades e assistência humanitÁ¡ria com as dinâmicas do género. Provavelmente que isso poderÁ¡ causar uma maior compreensão sobre o que é necessÁ¡rio para assegurar que as circunstâncias especiais da mulher durante as calamidades naturais não sejam apenas reconhecidas, mas que o Estado aja no sentido de alterÁ¡-las.

Pelo que, vai ser preciso que as organizaçÁµes de sociedade civil pensem estrategicamente sobre como se alcançar o desiderato transformar essas calamidades em plataforma para operar mudanças sociais.

Bayano Valy é o Editor do Serviço Lusófono de Opinião e ComentÁ¡rio da Gender Links. Este artigo faz parte do Serviço Lusófono de Opinião e ComentÁ¡rio da Gender Links


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