Moçambique: Género – Uma realidade ou uma questão de metas PolÁ­ticas?


Date: May 30, 2012
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Beira, Abril de 2012 – A cientista social Verena Stolcke disse que “em um mundo globalizado, dominado pelo paradigma económico neo-liberal que constantemente trai suas promessas de maior bem-estar para um maior número de seres humanos, o elogio das diferenças apenas implica o perigo não somente de mascarar as crescentes desigualdades e seus motivos, mas também de alentar novas fracturas e conflitos, condenando ao esquecimento as relaçÁµes de poder que, de facto, subjazem Á s exclusÁµes e discriminaçÁµes sociais e de género”.

Vai daÁ­ que desde a transição para um regime multi-partidÁ¡rio e uma sociedade pluralista nos inÁ­cios dos anos de 1990, Moçambique tem uma sociedade civil jovem, maioritariamente feminina mas dinâmica. A mulher em Moçambique representa a maioria da população sendo necessÁ¡rio o seu maior envolvimento nos domÁ­nios polÁ­tico, económico e social.

Segundo a Associação das Mulheres de Carreira Jurista, as mulheres constituem a camada social que é sistematicamente excluÁ­da da participação polÁ­tica, económica e da produção e benefÁ­cios do desenvolvimento. São as últimas a usufruir dos esforços do crescimento devido Á  sua posição económica e social subalterna, o que resulta numa contÁ­nua falta de oportunidades para a sua educação, formação, acesso Á  saúde, emprego e outros serviços sociais embora nos últimos anos esforços estejam a ser feitos com vista a inversão do cenÁ¡rio.

Neste contexto, se ela representa a maioria da população e ao mesmo tempo continua sendo aquela que é mais excluÁ­da no processo de planificação e até ao processo de tomada de decisÁµes na sua relação com o poder, então surgem algumas dúvidas:

Os números que nos são apresentados publicamente sobre o avanço e participação da mulher no processo de decisão são reais? As referências que nos são apresentadas actualmente como exemplo de mulheres com oportunidades são as que realmente interessam a maioria da população ou a um determinado grupo de pessoas com fins não muito claros? Não serÁ¡ a questão de Género em Moçambique mero assunto de metas polÁ­ticas com vista a agradar os parceiros de cooperação que querem ver as barreiras da participação da mulher na tomada de decisão junto ao poder ultrapassadas? Não serÁ¡ apenas uma questão de globalização?

Entendendo género como uma construção social do que significa ser mulher ou homem numa determinada sociedade, verifica-se a existência de estruturas institucionais e prÁ¡ticas comuns que estabelecem e conservam uma ideologia que defende e procura legitimar posiçÁµes e acesso diferenciados aos recursos.

Por isso, os governos e outros actores sociais, numa perspectiva mais analÁ­tica que prescritiva, deveriam promover polÁ­ticas e acçÁµes para a integração das questÁµes de género em todos os programas e planos, ou seja, aplicarem uma filosofia integrada de institucionalização de género.

Alguns dos leitores, irão responder-me no seu silêncio que existem esta integração de assuntos relacionados com a mulher nos programas e planos. E eu pergunto: Onde estão os resultados?

Só para colocar as coisas em perspectiva, existem em Moçambique oito ministras, três governadoras provinciais e um punhado de administradoras distritais, dentre 22 milhÁµes de habitantes, segundo o censo de 2007. Em contrapartida existem 21 ministros, oito governadores provinciais.

Podemos considerar um resultado animador para um paÁ­s que tem como maioria da população mulheres? Os dados do Instituto Nacional de EstatÁ­sticas (2007) mostravam que as mulheres constituÁ­am 52% do total da população moçambicana.

Como afirma Butler (2000), a agenda polÁ­tica para o planeamento de um futuro melhor deveria, portanto, contemplar, seguramente entre muitos outros temas, o modo como as relaçÁµes de poder contemporâneas, articuladas com poderosos interesses económicos, constrangem a nossa liberdade de viver nos nossos desejos e de forjar os nossos destinos diversos em comunidade.

Para as mulheres hoje, igualdade de oportunidade é muito mais do que um punhado de mulheres no poder. Implica haver igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, significa o direito Á  educação, Á  saúde e ao trabalho. Significa o direito ao controlo do seu próprio corpo e da sua sexualidade, bem como o acesso Á  terra.

O novo governo francês fez o que a região da SADC promete fazer até 2015, isto é, ter uma paridade nos órgãos de tomada de decisão, ao nomear um número igual de homens e mulheres no conselho de ministros. Os analistas de questÁµes de género dizem que a nomeação não é uma mera operação cosmética visto haver mulheres em ministérios como a justiça, trabalho (Á  semelhança de Moçambique) e ensino superior, entre outros.

VÁ¡rios anos passaram desde que o debate sobre a inclusão das mulheres nos órgãos de tomada de decisão iniciou, sendo que, talvez tenha chegado a altura de a representatividade das mulheres ser mesmo efectiva e não apenas um exercÁ­cio aritmético para o inglês ver.

Celina Henriques é uma jornalista freelancer. Este artigo faz parte do Serviço de Opinião e ComentÁ¡rio da Gender Links, oferecendo-te novas perspectivas sobre notÁ­cias do dia-a-dia

 

 


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