Moçambique: Inclusão efectiva da mulher ainda uma miragem?


Date: May 30, 2012
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Maputo, 29 de Maio de 2012 – Em 2010, Moçambique elaborou uma Estratégia e Plano de Acção do Género, Ambiente e Mudanças ClimÁ¡ticas com vista a ajudar a responder aos efeitos das mudanças climÁ¡ticas e incluir a mulher na gestão dos recursos naturais.

A inclusão da mulher na gestão dos recursos naturais parte da constatação de que a mulher é mais afectada pelo impacto das mudanças climÁ¡ticas, sendo que a sua vulnerabilidade é notÁ¡vel durante as cheias e secas.

A estratégia e plano de acção, elaborada pelo Ministério para a Coordenação da Acção Ambiental, toma em conta o facto de que 52% da população de mais de 21 milhÁµes são mulheres; 80% da população vive nas zonas rurais e 60% nas zonas costeiras mais expostas Á  subida do nÁ­vel das Á¡guas do mar, ciclones a inundaçÁµes dos grandes rios.

A maioria das mulheres estÁ¡ envolvida na agricultura familiar onde o seu trabalho é considerado parte integral das responsabilidades domésticas da mulher. Um dos sectores atingido pelos efeitos das mudanças climÁ¡ticas é o da agricultura, com cerca de 80% da mão-de-obra constituÁ­da por mulheres e como diz o agro-economista moçambicano, Firmino Mucavel, “no sector agrÁ¡rio os primeiros que sofrem os efeitos da seca e das mudanças climÁ¡ticas são as mulheres”.

No terreno, as infraestruturas são fracas ou inexistentes, os sistemas de protecção social para as comunidades mais vulnerÁ¡veis ainda não foram fortalecidos, e os possÁ­veis impactos das mudanças climÁ¡ticas nem sempre são contemplados nos planos de desenvolvimento.

Uma das acçÁµes previstas na estratégia é envolver as mulheres na criação de florestas comunitÁ¡rias. O que se vê no terreno, pelo menos em muitos dos distritos do paÁ­s, é que as mulheres participam sim na criação de florestas, mas como quem cumpre ordens do lÁ­der da comunidade e não como pertença das mulheres daquela comunidade.

Por exemplo, Gorongosa, na ProvÁ­ncia de Sofala, centro de Moçambique, possui um total de 253 lÁ­deres comunitÁ¡rios, segundo dados fornecidos pela secretaria distrital, todos do sexo masculino. Consideramos isto como inclusão da mulher nos assuntos relacionados com mudanças climÁ¡ticas?
Muitas mulheres que vivem no campo não sabem da existência da Estratégia de Género, Ambiente e Mudanças ClimÁ¡ticas. Muitas delas sabem que hÁ¡ mudanças que estão a acontecer, mas não entendem porquê, não têm noção de que um dia a terra vai acabar, os rios não terão mais agua e as florestas não mais existirão se continuarem a utilizar os recursos de forma não cuidada
Mais uma vez afigura-se importante e urgente que a inclusão da mulher não seja interpretada apenas como um assunto de criação de polÁ­ticas e estratégias. A inclusão da mulher nos assuntos ligados ao ambiente ultrapassa polÁ­ticas e estratégias, significa, no meu entender, ter a presença da mulher, não só a da cidade, mas também a camponesa desde a planificação até aos momentos de tomada de decisão.

Como afirma Hermano do Carmo, no seu livro Teorias de Desenvolvimento ComunitÁ¡rio, “o desenvolvimento das comunidades deve ser endógeno e não exógeno”. As próprias comunidades, muitas delas, diga-se de passagem, ainda não compreenderam o porquê da conservação e maneio correcto dos recursos naturais.

Elas assumem as questÁµes ambientais como assunto do ministério e seus parceiros. Por uma lado, as mulheres, por serem a maioria, pobre, analfabetas e muitas vezes sem oportunidades para discutir assuntos em pé de igualdade com o homem, devem ser privilegiadas na criação dos Comités de Gestão de Recursos Naturais, capacitadas e empoderadas para implementar e fazer valer os preceitos para um maneio correcto e uma melhor conservação dos recursos naturais, visto serem aquelas que mais possibilidades têm para passar mensagens positivas ou educativas Á s crianças e outras mulheres.

Por isso, em minha humilde opinião, o Ministério para a Coordenação da Acção Ambiental deve adoptar novas formas de implementação da Estratégia de Género e Mudanças ClimÁ¡ticas criando mais condiçÁµes para um maior envolvimento da mulher não apenas como membro e participante passiva nos Comités de Gestão de Recursos Naturais, mas como membro activo, bem como capacitar as associaçÁµes de mulheres nos diferentes sectores de actividades económicas, sobretudo aquelas que lidam diariamente com os recursos naturais, no campo.

Celina Henriques é uma jornalista freelancer. Este artigo faz parte do Serviço de Opinião e ComentÁ¡rio da Gender Links

 


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