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Eu tenho 45 anos e mãe de 3 filhos (uma menina e dois rapazes). Sou professora de profissão mas quando casei o meu marido pediu-me para abandonar o trabalho fora de casa. Mas mesmo assim não teve problemas em me convencer a gerir um estabelecimento comercial que estava para abrir. Não temos casa e vivemos num dos compartimentos da loja.
Quando em 1991 nasceu o meu primeiro filho, pedi-o para pensar em adquirir um terreno, onde pudéssemos construir uma casa para a famÁlia. Só que ele sempre negou.
Para piorar a situação, tempo depois do nosso casamento começou a agredir-me fisicamente sempre que não concordasse com ele. E hÁ¡ 15 anos vivo em situação de violência com o meu marido.
Tenho em mente dois momentos mais marcantes na minha história de sofrer agressÁµes fÁsicas. Em 2000, o meu marido trouxe um padre mazione para casa com o intuito, segundo ele, de “tratar a casa” de modo a que pudesse ter riqueza. O tratamento envolvia colocar raÁzes e outras drogas dentro da casa. Só que eu não concordei e ele bateu-me.
Num domingo em 2007, eu estava a preparar-me para ir a igreja e do nada ele começou a agredir-me. Tive que parar no hospital. No hospital aconselharam-me a ir meter queixa Á polÁcia. A polÁcia notificou o meu marido que na presença das autoridades assumiu que tinha discutido comigo mas que não tinha chegado a agredir-me até ao ponto de me machucar. Até acusou-me de ter combinado com o médico para lhe prejudicar. Mesmo assim, ele foi condenado a pagar uma multa e, graças a Deus, foi a última vez que me agrediu fisicamente.
Em 2009, por causa de constantes desentendimentos entre nós, passamos a dormir em comodos separados. O meu marido decidiu ficar na parte de dentro da loja e eu fui arredada para o lado de fora com os meus filhos. Mas o lado de fora nem condiçÁµes bÁ¡sicas para saneamento tinha e muito menos energia.
Ele deixou de cumprir com as suas obrigaçÁµes financeiras. Tive que encontrar meios alternativos para a minha subsistência e a dos meus filhos. Comecei por abrir uma machamba enquanto procurava regressar Á profissão de professorado.
Em 2010, consegui voltar a trabalhar como professora. E assim juntei algum dinheiro e quando jÁ¡ tinha o suficiente, tratei a papelada para montar credelec no meu cantinho da casa. Quando o meu marido se apercebeu do que estava a passar, expulsou os técnicos que jÁ¡ se preparavam para executar o trabalho.
Fiquei indignada e levei o caso ao tribunal. A procuradoria enviou uma equipa para fazer uma vistoria ao local mas o meu marido não deixou a equipa efectuar o seu trabalho. Algum tempo depois o meu marido decidiu instalar energia no meu lado da casa, mas o quadro foi instalado do lado dele. E liga e desliga sempre que lhe apetece porque ele é que paga a conta de energia.
Este ano ele foi pedir uma declaração na Acção Social para mandar o nosso filho mais novo, de 12 anos, Á casa do Gaiato, com a desculpa de que estamos separados e que não tem condiçÁµes para cuidar do filho menor sozinho. A Acção Social veio para a minha casa para fazer uma acareação dos factos.
Eu disse que não tinha condiçÁµes para continuar a dar educação ao nosso filho, e que concordava que podia ir estudar na Casa do Gaiato mas que não queria que ele fosse viver no orfanato. Queria que ele voltasse Á casa todos os dias depois das aulas.
Quando o marido apercebeu-se de que não iria conseguir os seus intentos, mandou embora da casa dela a assistente social berrando e proferindo insultos.
Neste momento, estou empenhado a procurar ajuda judicial para por termo a esta situação. Pretendo que se processe a divisão dos bens. Estou cansada e quero começar uma vida nova e melhorar as condiçÁµes de vida dos meus filhos. Mas a coisa estÁ¡ difÁcil porque nunca casamos oficialmente. Mas mesmo assim não vejo a hora de me livrar dele e começar uma nova vida.
Esta estória faz parte da série das Estórias “Eu” produzidas pelo Serviço Lusófono de Opinião e ComentÁ¡rio da Gender Links para o 16 Dias de Activismo sobre Violência Baseada no Género.
Comment on Moçambique: Vivendo com a violência doméstica