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Quando concluÁ a Sétima classe, em 2010, não consegui ter colocação no curso diurno porque disseram que tinha uma idade avançada para estar no curso diurno. Mas porque não podia parar de estudar aceitei a proposta de ir fazer a Oitava classe no curso noturno, na Escola SecundÁ¡ria de Mandlakazi.
A última aula terminava por volta das 23h45 e eu precisava de atravessar a vila inteira para chegar Á minha casa que dista uns quatro quilómetros da escola. Eu saÁa sempre com as minhas amigas para fazer esse percurso.
Havia um moço chamado Adérito, filho de um dos homens mais ricos da minha zona. Apesar de ter desistido de estudar fazia uns dois anos, fazia questão de ficar no portão da escola com os seus amigos Á espera das raparigas da zona. Eu o conhecia mas não nutria nenhuma simpatia para com ele, e sempre sentia-me seguro porque sendo jovens da zona pensei que nos fossem proteger.
Passados dois meses, Adérito começou a assediar-me, falando-me de um grande amor que sentia por mim. Eu sempre disse-o que não estava disposto a namorar; que o meu objectivo era estudar porque essa era a minha prioridade.
Um mês depois da nossa conversa ele voltou a pressionar-me, dizendo que jÁ¡ não aguentava mais viver sem mim. Mas eu dei-o a mesma resposta: não queria namorar mas que podÁamos ser amigos.
Mas debalde! Uma noite enquanto regressava sozinha das aulas e jÁ¡ a entrar no desvio para a minha casa, encontrei-o com os seus amigos que amigavelmente interpelaram-me, aproximando a mim.
Adérito disse que queria pegar a minha mão. Eu sorri e procurei afastar-me deles. Mas antes que eu pudesse dar dois passos ele alcançou-me e deu-me uma rasteirada, ao mesmo tempo que amordaçava-me para que ninguém ouvisse os meus gritos. Ele pediu a ajuda dos seus amigos para me segurarem as penas e os braços.
Por mais que esperneasse não consegui-me livrar dele. Ele violou-me e quando acabou, os seus amigos seguiram-no o exemplo.
Deixaram-me alÁ inconsciente. Fui encontrada de madrugada pelos meus vizinhos ainda inconscientes. Correram para chamar a minha mãe que de imediato comunicou as estruturas do bairro e levou-me ao hospital.
Fiquei internada duas semanas enquanto o caso era encaminhado Á polÁcia, que imediatamente deteve os estupradores.
Ao se aperceber do sucedido, o pai de Adérito dirigiu-se a minha casa e ameaçou a minha mãe, exigindo que retirasse a queixa para que o seu filho fosse solto, alegando que aquilo era normal entre os jovens. A minha mãe não concordou e nem se acobardou. Ela prontamente recorreu Á associação de mulheres de que era membro para pedir ajuda e protecção.
Infelizmente, ao chegarem Á esquadra, viram que os jovens haviam sido soltos.
Foi aÁ que as mulheres mobilizaram-se e exigiram que a polÁcia voltasse a deter os infractores, e como a polÁcia demorava a responder Á s nossas exigências, recorremos Á s entidades governamentais para ajudÁ¡-las a pressionar as entidades de justiça.
O pai de Adérito continuou a ameaçar as famÁlias envolvidas de modo a desistirem de levar o caso Á justiça. Mas não conseguiu os seus intentos porque dois meses mais tarde o caso chegou ao tribunal e os estupradores foram condenados.
Durante algum tempo quis desistir de estudar mas as matronas da associação ajudaram-me a perceber que precisava de seguir em frente e preparar o meu futuro. Aceitei voltar Á escola e infelizmente seis meses depois fui diagnosticado com o vÁrus do HIV e SIDA.
Quando Adérito saiu da cadeia, veio acompanhado das estruturas do bairro e seu pai Á minha casa para fazer um pedido formal de desculpas, mas nada do que ele disse pode devolver a minha virginidade e dignidade.
*Os nomes são fictÁcios para preservar a imagem dos envolvidos.
Esta estória faz parte da série das Estórias “Eu” produzidas pelo Serviço Lusófono de Opinião e ComentÁ¡rio da Gender Links para o 16 Dias de Activismo sobre Violência Baseada no Género.
Comment on Mozambique:Estuprada e deixada com HIV e SIDA